quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Opinião: Jogo do Bicho - O que se quer dele?

Que o "jogo do bicho" é uma contravenção, ninguém discute. Que ele atua na "ilegalidade", todo mundo sabe. Que patrocina escolas de samba, não chega a ser nenhuma novidade! Não sou contra nem a favor do dito cujo, até porque nunca fiz uma aposta sequer em toda minha vida, mas me acho no direito de, enquanto cidadão, falar alguma coisa a respeito, principalmente após os últimos acontecimentos.
Para mim jogo é jogo, não importa se é com o aval do Governo Federal ou dos Governos Estaduais, se o cidadão foi lá e apostou, está valendo.
A diferença que existe entre eles é que enquanto Mega Sena, Loto, Quina e afins recolhem os respectivos impostos para que sejam utilizados em "objetivos sociais" o Jogo do Bicho transita pelo caminho da ilegalidade, uma vez que não se tem conhecimento do grau de transparência do resultado, do percentual destinado aos ganhadores e do valor apurado com as apostas.
Segundo Maria do Carmo Andrade (Bibliotecária da Fundação Joaquim Nabuco)  "...o jogo do bicho foi criado pelo Barão João Batista Viana Drummond, carioca que viveu no final do século XIX, na cidade do Rio de Janeiro. O Barão de Drummond era um empresário de grande prestígio na Corte, participava de vários empreendimentos e investimentos e era acionista da Cia Ferro Carril Vila Isabel.
Vila Isabel foi o primeiro bairro planejado da cidade do Rio de Janeiro. No projeto de criação do bairro estava previsto a instalação de um parque e de um jardim zoológico, jardim esse que mais tarde seria o nascedouro do jogo do bicho.
 O então Comendador Drummond, conhecendo o projeto, solicitou, em 1884, permissão para instalar o jardim zoológico. Quatro anos depois, em julho de 1888, houve a inauguração oficial do empreendimento que tornou-se um sucesso. Nesse mesmo ano, Drummond recebeu do Imperador Pedro II o título de Barão.
 Em 1890, o Barão, executando a segunda parte do projeto, ampliou as instalações do zoológico e criou um parque com plantas exóticas. Todavia, a situação financeira do zoológico, que já era difícil mesmo com a ajuda financeira recebida pela municipalidade, piorou com a criação do parque.
 O orçamento já não era suficiente para cobrir as despesas com a alimentação dos animais e a manutenção do parque. O Barão tentou solucionar o problema cobrando ingressos dos visitantes, mas essa medida não foi bem aceita e provocou um efeito contrário: os frequentadores do jardim zoológico desapareceram.
 O Barão recorreu, mais uma vez, à Intendência Municipal, visando obter licença para explorar jogos públicos lícitos nas dependências do zoológico, com a finalidade de trazer de volta o público visitante. A licença foi permitida desde que não incluíssem os chamados jogos de azar, conforme estava previsto no Código Penal de 1890.
 O mexicano Ismael Zevada, auxiliar do Barão, com o intuito de colaborar para a solução do problema mencionou o “jogo das flores” que existia em sua terra e que poderia ser adaptado para os “bichos”. A ideia foi analisada e posta em prática: foram pintados 25 quadros, cada quadro com um bicho, numerados a partir de 1. Antes de abrir o zoológico, o Barão escolhia um quadro e colocava-o em uma caixa que ficava estrategicamente a sua entrada. Em cada ingresso havia a figura de um dos vinte e cinco bichos. Às 15:00, a caixa era aberta e aqueles que tivessem no ingresso o bicho sorteado, eram os ganhadores de um prêmio em dinheiro.
 O primeiro sorteio ocorreu num domingo, em 3 de julho de 1892. O bicho sorteado foi o avestruz. Nessa ocasião também foram disponibilizados para o público outros entretenimentos, porem o jogo do bicho foi o que obteve maior aceitação e mais repercussão na imprensa diária, mais do que a própria reinauguração do zoológico.
 Jornal do Brasil, Jornal do Commercio, O Paiz, Diário de Notícias, Gazeta de Notícias e O Tempo noticiaram os acontecimentos. Alguns confirmaram o grande número de visitantes inclusive autoridades, políticos e senhoras da alta sociedade carioca, outros informavam qual o animal sorteado, e foram criadas novas linhas de bondes especialmente para facilitar o acesso ao Zoológico.
 Logo o zoológico transformou-se em um lugar de lazer bastante concorrido. Duas semanas depois do primeiro sorteio, o valor do prêmio já havia quadruplicado. Os compradores dos bilhetes do bicho eram tantos que por mais de uma vez houve conflitos no local e o Barão foi obrigado a chamar a polícia para garantir a ordem.
 O zoológico foi transformado em lugar de jogatina, a situação virou um escândalo, o que desagradava às autoridades. O Barão não poderia imaginar que estava inaugurando um dos jogos mais populares e polêmicos do Rio de Janeiro e do Brasil.
 Diante dos conflitos, em 1895, o prefeito Werneck de Almeida publicou o Decreto 133, que proibia o sorteio dos bichos nas dependências do jardim zoológico. A essa altura os bilhetes do jogo do bicho passaram a ser vendidos na Rua do Ouvidor, que era então a mais movimentada do Rio de Janeiro e ficava bem distante dos portões do zoológico.
 Nessa época foram abertos os chamados bookmakers, casas de apostas que vendiam poules (pule) das mais diversas apostas, permitidas ou não, inclusive a do jogo do bicho, que passou a ter validade por quatro dias. Assim o apostador não precisava ir ao zoológico nem estar presente no momento do sorteio.
 Além dos bookmakers, o Barão espalhou pela cidade seus agentes para vender os bilhetes do bicho, sendo essa participação dos vendedores ambulantes  muito importante para o sucesso do jogo entre os apostadores. Para ser vendido nas ruas, o jogo do bicho passou por várias adaptações: a primeira foi vincular os bichos aos números, depois veio a divisão em grupos e dezenas.
 Em 1897, morre o Barão de Drummond, mas o jogo  continua. Em 1899, foi promulgada a Lei 628 que instituiu a pena de um a três meses de prisão para os acusados da prática do jogo do bicho.
 A imprensa teve sua contribuição na legitimação do jogo do bicho. Nas primeiras décadas do século XX, vários periódicos foram criados em função do jogo. Em 1903 começou a circular O Bicho, primeiro periódico dedicado ao jogo, mais tarde surgiram o Talismã e o Mascotte.
 Em 1915, o senador Érico Coelho apresentou um projeto de lei para legitimação do jogo do bicho, mas não foi aprovado. O poder público responsável pela Capital Federal, jamais conseguiu definir uma estratégia efetiva para combater os chamados “bicheiros” ou deixar claro por que algumas loterias eram permitidas e outras não.
 Em 1941 o jogo do bicho é incluído na lei de Contravenções Penais, com a cassação de todas as licenças concedidas para funcionamento de casas de jogo no Brasil, curiosamente, expandiu-se muito mais, acompanhando o crescimento de áreas periféricas.
 O bicheiro era conhecido pela honra à palavra empenhada, obtendo com isso a confiança e o respeito do apostador, que recebia ajuda pessoal e benfeitorias públicas em troca da sua lealdade.
 Dessa forma, o jogo do bicho, mesmo perseguido, passou a fazer parte do cotidiano, do folclore e da vida do povo brasileiro, já tendo sido motivo para muita discórdia e infelicidade; tristeza e alegria. Já foi tema para letra de música, roteiro de filmes, novela e enredo de escolas de samba. Foi também assunto para trabalhos acadêmicos, livros, artigos de revistas e muitas manchetes de jornais. A sua história já foi várias vezes sufocada, seguindo à margem da sociedade, mas continua sempre presente na cultura popular..."
Percebemos então que tudo teve um principio legal, legitimado pelas autoridades competentes da época de sua criação. Se a situação fugiu do controle governamental, a meu ver, deve-se menos a competência dos exploradores do jogo e mais a ineficiência dos governos que se sucederam até os dias de hoje.
Sinceramente, não consigo e nem quero acreditar que o Poder Público não tenha mecanismos para moralizar a situação. Acho até que existe uma cúmplice tolerância por parte das autoridades, pois no Rio de Janeiro não é preciso andar mais que 500 metros para se encontrar um escrevente do bicho. Hoje eles já trabalham até com Máquinas de Cartões, não é mais necessário ter dinheiro vivo para apostar e até o resultado se pega pela internet. Mas, se não estou enganado, para se obter uma máquina dessas tem que haver CPF ou CNPJ ativos e sem restrições. Portanto, algo não bate! É como diz o ditado "se o gato sumiu e a sardinha apareceu miando, tem alguma coisa errada ou alguém está me enganando".
O fato é que já vi inúmeras operações de caça as bruxas, principalmente às vésperas do carnaval, e nenhuma delas conseguiu impedir a jogatina.
Será que o caminho é realmente esse? Já foi demostrado que a repressão tende a aumentar ainda mais o interesse pelas apostas e não se ouve dizer que os banqueiros ficaram mais pobres por conta disso. Já passou da hora do poder público rever suas ações, usar menos a força e mais a inteligência, se é que existe a verdadeira vontade de moralizar a situação.




Um comentário:

  1. Ao questionar a honestidade do sorteio do jogo do bicho, te deixo a sugestão de explorar o "sorteio manipulado eletrônicamente" da mega sena e outras apostas oficiais. Rodou exaustivamente na internete no semestre passado um e-mail com essa denúncia. O qué é MORALIZAR o jogo do bicho? É pagar imposto para ser desviado pelo Governo? Deve-se primeiro moralizar o Governo.

    ResponderExcluir